sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Identidade

A madrugada continha-se e, sem lhe querer dar razão, com toda a força contrariava a solidão que se apoderava de mim com o passar daquele dia, que só terminara quando finalmente encontrasse uma razão para ser feliz, que não o amor – aquele sentimento devastador que não suporto, ao qual já não consigo lidar, que fura, que rebenta, que faz estragos, que abre feridas no nosso coração e que nos deixa marcas profundas e crónicas. Mas quando mais o tempo passava, mais eu me apercebia de que lutava contra algo invencível, que insistia e persistia perante algo insuperável. Corria por entre ruas ora desertas, ora movimentadas e seguia aquela que era a minha trajectória que me fazia reflectir sobre cada marca que surgia. Cada passada que dava era uma demonstração dos mais variados sentimentos que ao longo daquele passeio experimentava, conseguia, de certa forma, sentir uma estranha imagem ou talvez um diferente temperamento presente em cada pedaço desta jornada e, por vezes, fechava os olhos freneticamente e sentia o meu corpo a perder o equilíbrio. Não tinha bases, não tinha motivação, não tinha apoios, muito menos ambições naquele momento. No começo chorava e não entendia, e não entender dói, e a dor fazia com que eu chorasse, no começo. Sentia-me tão iludida por coisas que não existiam que nem me reconhecia. Acho que já só me restava continuar a criar ilusões que me permitiam seguir a minha vida, para que estas me possibilitassem avançar sem ter de lidar com os meus problemas. Sentia-me diferente, tal como se duas personalidades possuísse, uma que representava um alguém poderoso e destruidor dos seus próprios medos e receios, e outra tão frágil e meiga com um poder de abstracção em relação a tudo o resto, mostrando a minha sinceridade onde incidia para o egoísmo. Eu estava perdida, à espera que as minhas dependências desaparecessem, para me poder manter uma pessoa saudável, como sempre fui. Durante todo o dia caminhei com um semblante sombrio e coberta por vestes negras, as lágrimas continuavam constantes, os pesadelos vinham-me atormentar por horas a fio e estive de luto pelos nossos momentos agora já mortos. Todas as sensações corporais, tácteis, térmicas e dolorosas possíveis se convergiam no meu corpo ao mesmo tempo, tornando-o pesado, intolerável e insuportável, acho que é escusado voltar a dizer que já não sabia quem era, já não me reconhecia, já não controlava os meus actos. Não tinha orgulho em mim, não era capaz de me perceber, não era capaz nem de perceber os outros. Agora pertencia mais ao género de ficar parada a olhar e a vê-lo passar – o tempo. No fundo apenas tinha um nó no coração, uma sensação de não pertencer a lugar nenhum, uma vontade de desaparecer, de me livrar dos compromissos, de arrancar toda aquela tristeza intensa e angustiante para fora do meu peito, uma vontade de me esquecer de mim ou fugir de quem eu sou. Apenas pairava no ar um descontentamento que nada tinha de exuberante, que me fazia involuntariamente ir para além da realidade, mantendo somente a dor como a única coisa real naquele dia. Foi a ultima noite em que meu coração bateu, pelo que me recordo, mas houve beleza e leveza. Até o meu reflexo no espero gritava um torpor resultando do álcool, e ali fiquei, e aquele foi o dia em que saí rumo à descoberta do desconhecido com a intenção de provar que é possível ser-se feliz de outras maneiras, apenas me provou que não existem atalhos para evitar o caminho do amor. No final apenas pude chegar à conclusão de que amar dói arduamente, lutar cansa e sonhar destrói. É algo que não podemos evitar, negar ou até contrariar, mas é sempre algo que podemos omitir, mas depois deste dia percebi que não é solução para nada.
Perdoem-me a negligência e a extensão do texto.
 *passado*

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